Topo

Foto; Miguel Horta
Quantas vezes não me questiono sobre a existência de Deus e, no entanto, a resposta pode estar ali ao lado, numa fajã distante que se estende até ao oceano. Beleza abrupta, densamente verde, pendendo das falésias vulcânicas até alcançar o azul. Na ponta da ilha de São Jorge, o Topo, vila pequena encaixada na natureza agreste em total harmonia. Três foguetes estalam no ar! Fieis, padre, mordomo da festa, “amigos” e “irmãos” vêm subindo a rua íngreme sob a toada ensaiada da banda com seus metais reluzentes e estandartes drapejando ao vento Sul. É dia de festa, vestem todos a rigor: O Espírito Santo vai ser coroado pelos meninos, lá no Império do cimo da rua, impecavelmente conservado de cores garridas brilhando na luz primaveril. Pendem colchas trabalhadas das varandas onde os vizinhos se debruçam para acompanhar o cortejo. À porta do café, de cigarro pendurado na boca, aqueles que não foram convidados para as Sopas do Espírito Santo espiam tamanha fartura de bolos e flores em grandes travessas que os crentes exibem calçada acima. Mãos rudes, calejadas do mar ou da lavoura trazem as insígnias. No meio da rua está uma mesa farta, a abarrotar de ofertas; cai a água benta sobre elas e todos fazem o sinal da cruz. O mordomo distribui a esmola pelos carentes da freguesia (pão, carne e vinho de cheiro). Depois avançam os meninos com suas coroas, num quadrado feito de varas, como que protegendo a santidade daquelas crianças. No interior do Império é coroado o Espírito Santo pela mão do menino sábio, como dizia Agostinho da Silva. Impossível deter as lágrimas na presença do nosso genuíno... rolam embaciando a objectiva. Sinto uma palmada nas costas: Anda rapaz! Deixa-te de lamechices e vamos às Sopas!

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