O escaravelho das nossas árvores

Ilustração: In Troncos e marés.
Miguel Horta, acrílico sobre tela, Appleton Square. 2012
Tempos estranhos, estes… A palmeira que fica em frente à janela da nossa casa morreu. Aos poucos foi deixando cair as palmas, desamparadas, no chão. Exatamente como uma pessoa que desiste, acometida por uma profunda mágoa. “É a praga do escaravelho”, diz-me o jardineiro de cenho carregado. Percorro as ruas e as estradas do meu país; aqui e ali, lá estão as palmeiras mortas, silenciosas, às vezes apenas um toco serrado abandonado num jardim onde já ninguém vai. Quando atravesso o Alentejo e vejo um montado bem tratado, fico contente; nada me dói mais do que um sobreiro morto na imensidão da paisagem. Sou irmão daquela árvore, o seu todo representa uma pessoa de gesto erguido aos céus. No meu País as árvores vão morrendo tristes, acometidas por uma qualquer praga, tal e qual as pessoas com quem me cruzo todos os dias, atacadas em segredo pelo inseto voraz da tristeza. Falo-lhes da praga, mas elas olham para o lado, habituadas que estão ao seu fiel parasita. É possível mudar, digo-lhes com olhos de jardineiro. É possível fazer medrar o futuro, reflorir, redesenhando horizontes. A cobardia é tóxica, não favorece os brotos; no entanto, este é o tempo das grandes podas, da fertilização do território, para que a floresta que somos não feneça.  

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